terça-feira, 24 de novembro de 2009

Lula, Dona Canô, e o destemperado no Programa do Jô

Caetano Veloso disse que Lula fala errado. Nenhuma novidade. Criticou também o modo como apresenta o governo, dizendo que antes [com FHC] era melhor. Novidade nenhuma, partindo dele (compositor, provocador, estudioso de filosofia, sociologia e adepto de modismos outros, além de narcisista contumaz, autor do epíteto “A Falha de S. Paulo”, num momento em que se indispôs com algo publicado pela “Folha”, diário paulistano) . A novidade foi que Dona Canô, mãe do músico, disse a Lula, por telefone, que não gostou das declarações do filho, e que delas discordava. Importante notar que a crítica de Caetano a Lula foi publicada num texto que o baiano escreveu em artigo na Folha de S. Paulo, por ocasião da morte do antropólogo francês Claude Lévi-Srauss, a quem faz referência numa de suas composições.
O resumo da história da conversa entre Lula e Dona Canô saiu na Folha de domingo, 22 de novembro de 2009 (p. C8). Sob o almodovariano título “Tudo sobre minha mãe”, o texto diz: “Lula e Dona Canô, 102, mãe de Caetano Veloso, se falaram por telefone nesta semana, depois de ela ter discordado de declarações do filho sobre o presidente...”. Ok. Quem sabe ler sabe entender. E quem não sabe? Ou não leu?
Quem só assistiu ao Programa do Jô de segunda-feira, 23 de novembro, além de ver um novo e ótimo grupo musical, ficou com outra impressão do episódio da crítica a Lula. Havia lá um cidadão sendo entrevistado que estava mais disposto a fazer discurso. Ele começou com uma destemperada declaração contra o governo e a diplomacia brasileira por causa da visita do presidente do Irã a Brasília. Pregava o isolamento total, o totalitarismo, chegando quase a babar. Inicialmente (e surpreendentemente) Jô parecia anestesiado diante do discurso do cidadão a quem ele chamara como sendo um “jornalista polêmico” – melhor se tivesse dito panfletário – e manifestou certo desconforto ao interferir, o que conseguiu a duras penas, o que convenhamos, não é comum em seu programa. Disse que era preciso que falassem do assunto sobre o qual ele havia sido convidado para o programa. O cidadão consentiu. Assoou o nariz, disse que não estava irritado (Jô disse: “tá sim, tá sim”), e continuou, sem dar vez ao Jô. Atacou o governo por pretender controlar a imprensa, como na ditadura. Jô interveio e disse que, naquele tempo, houve censura etc. e tal. O cidadão não se deu por achado, e disse claramente que, naquele tempo a imprensa não fez o que deveria ter feito (“imprensa tem que ser contra o governo”), pois o que existia era uma continuidade do que vinha da era Vargas, com quem Samuel Wainer era mancomunado e outros jornalistas com outros governantes. Disse mais: “nós, depois da ditadura, fizemos uma imprensa profissional (?). Agora, cada um tem sua opinião, sua preferência, tudo muito claro”. E arrematou: “o Lula não gosta de crítica. O Caetano criticou Lula e ele [Lula] ligou pra mãe dele [Caetano]”.
Aí o cidadão saiu do tom de vez, ficou de pé, instou a platéia e bradou: “Cuidado, se alguém aí criticar o Lula, ele liga pra tua mãe”. Pois é, nessa altura a cara do Jô dava aquela impressão de quem está pensando: quem foi na produção que chamou esse cara? ... Coisas de um programa ao vivo, em que um cidadão mal intencionado se utiliza do espaço riquíssimo para alardear opiniões sob encomenda. Pelo que se lê do que está escrito na Folha, a questão não foi essa. Logo, o cidadão distorceu. Além disso, deveria citar outro governante, José Serra. Este, quando não gosta do que escrevem/falam sobre ele, liga para a redação do jornal, revista, tevê, rádio, e pede a cabeça do autor da reportagem, quiçá também do editor... Não deve ser o caso desse cidadão, pois deixou claro que, de alguns governantes, ele fala bem.
Prefiro ficar com Millôr Fernandes, para quem imprensa é, sempre, oposição. Fora disso, “é armazém de secos e molhados”.

Nenhum comentário: